sexta-feira, setembro 08, 2006

Internet e Academia: the good, the bad & the ugly

Apesar de ter sugerido este tema, temo que identificar os aspectos bons (“good”), ruins (“bad”) e horríveis (“ugly”) da relação internet e academia seja uma tarefa subjetiva e muito influenciada pela experiência individual. Além destes, existem ainda os aspectos “polêmicos”, que dificultam a atribuição de adjetivos. Enfim, estou curiosa para descobrir quais questões seriam consenso nesta ciranda de setembro do Roda de Ciência e se há controvérsias, e quais os argumentos? Esclarecimentos prévios (talvez desnecessários?): ACADEMIA aqui se refere ao ambiente acadêmico ou universitário, onde predominam as atividades de ensino e pesquisa, voltado para a formação de recursos humanos, no sentido mais amplo que o termo “formação” compreende. E INTERNET se refere ao conjunto de ambientes e ferramentas virtuais em ampla expansão e diversificação que tem revolucionado a comunicação e o acesso à informação, no sentido mais amplo que o termo “revolucionar” compreende.

GOOD
De modo geral, a INTERNET promove o acesso quase irrestrito à informação (pessoas, opiniões, bancos de dados, artigos, instituições, formulários, “softwares” e aplicativos para uso “on-line” ou “downloads”), a operacionalização deste acesso através de sofisticadas ferramentas de busca (tipo Google, PubMed-Medline, Blast – para os entendidos em sequenciamento :), Wikipedia e outros), a realização de um “n” número de operações (compras/comércio, movimentações bancárias, ensino à distância, vídeo-conferência, “uploads” de documentos, envio de mensagens instantâneas ou via correio-eletrônico) e outras inúmeras atividades (“blogs” incluídos) que nem me atrevo a tentar listar, pois o risco de soar incompleta é grande, dado o grau de inovação das iniciativas em tecnologia da informação. O grande e inegável benefício da INTERNET é a DEMOCRATIZAÇÃO do acesso à informação (não necessariamente o Conhecimento, mas este também pode estar incluído aí) e à comunicação. Invocar a democratização nem sempre significa que não haja um público excluído (seja devido à censura institucional, seja por falta de infra-estrutura básica (computador+provedor)), mas esta situação ocorre a despeito da realidade tecnológica disponível.

A minha impressão atual é de que a Academia tem uma relação íntima e altamente dependente com a Internet. O uso de informação on-line e atualizada já é um vício acadêmico, a comunicação via e-mail permite o gerenciamento de listas/grupos de discussão (de um laboratório, uma classe, um curso, um departamento, da universidade, etc), o contato direto com pesquisadores/professores, a transferência de diferentes conteúdos em uma variedade enorme de formatos (arquivos), além de – supostamente – preservar o sigilo desta informação, e onde cada endereço eletrônico deveria corresponder a uma única identidade.

Páginas da “web” dedicadas a disciplinas, cursos e universidades ou institutos de pesquisa podem ser verdadeiros catálogos com informações sobre praticamente tudo relacionado ao tema. Na página da UNICAMP, por exemplo tem-se acesso desde o regimento geral, e despachos da administração até o cardápio do “bandejão”, sendo possível consultar ramais telefônicos e contatos (email) de funcionários dos mais diferentes departamentos e cursos. Eu mesma já encaminhei uma mensagem de e-mail diretamente ao reitor da UNICAMP há alguns anos para comentar a questão dos recém-doutores e o reconhecimento da sua contribuição nas atividades de pesquisa e ensino da Universidade (para a qual recebi uma resposta quase em tempo real!).

Ainda na UNICAMP, uma iniciativa recente é a digitalização das teses de mestrado e doutorado defendidas na instituição e disponibilizadas via arquivo pdf. As minhas teses de mestrado e doutorado já foram “downloadadas” 30 e 47 vezes, respectivamente, impressionante. Estou curiosa para saber quando (e se) a tese de doutorado do jornalista de ciência Marcelo Leite estará disponível para “download” :). Em uma consulta relâmpago me deparei com o seguinte título: “No “mundo dos jornalistas”: interdiscursividade, identidade, ethos e generos”, de autoria de Jauranice Rodrigues Cavalcanti (tese apesentada para obtenção do título de doutorado), com 98 “downloads” e 370 visitas (fiquei no chinelo... :)). Consulta à palavra-chave “BLOG” gerou apenas um resultado (Entre o publico e o privado : um jogo enunciativo na constituição do escrevente de blogs da internet) de um doutorado em lingüística, mas já confirma que a academia “pousou” seus olhos vigilantes e interrogativos nesta “modalidade” de divulgação on-line. Registre-se ainda 6 títulos para “internet e educação”.

O cadastro e a busca de pesquisadores e grupos de pesquisa operacionalizado pela plataforma Lattes do CNPq é outra experiência que tem tido uma enorme repercussão na comunidade científico-acadêmico, seja pela sua obrigatoriedade seja pela disponibilidade de um extenso banco de currículos com dados completos e atualizados (uma vez que estas informações são consultadas nos julgamentos de propostas de pesquisa).

O portal CAPES de acesso a periódicos científicos é outro ambiente da internet que compõe a linha “democratização” do conhecimento científico, promovendo o acesso ao conteúdo de inúmeros periódicos científicos – mais ainda pode ser melhorado – a um conjunto de instituições consorciadas. Além deste formato de acesso restrito a assinantes ou consórcios, iniciativas de promover o acesso aberto a publicações científicas de alto impacto figura entre um dos maiores benefícios da relação internet-academia (ver exemplo aqui da PLoS – Public Library of Science).
Da minha área de atuação uma das contribuições mais evidentes e significativas com relação ao desenvolvimento de projetos de pesquisa em genética e biologia molecular é o GenBank, um banco de dados que cadastra sequências nucleotídicas (mais de 100 Gb – gigabases - de informação em 2005) e uma variedade de ferramentas de busca e análise destes dados. Um verdadeiro portal para desenvolvimentos em bioinformática, sendo um banco de dados de referência para projetos de caráter mais específico (como o banco de genomas mitocondriais AMiGA).

O ensino à distância é uma realidade mais recente, e extremamente popular no caso de universidades particulares, que representa uma inovação na relação professor-aluno (polêmicas à parte, incluo esta atividade sob a guarda de “GOOD”).

Poderia facilmente me estender sobre o benefício da relação internet-academia (pois é o que predomina, na minha opinião), mas não é este o propósito do comentário, mas sim refletir que esta relação “saudável” nem sempre é regra e outros aspectos chamam a atenção...

BAD
Mas... e o que dizer de verdadeiros fenômenos de popularidade como portais de relacionamento social (Orkut) e afins? Salas de bate-papo (ou “chats”), comunicadores instantâneos como o Messenger, Skype, e similares, grupos eletrônicos, como o Yahoo Groups e inúmeros outros aplicativos ou ambientes “on-line” que promovem alucinadamente a comunicação via rede mundial de computadores (blogs, incluídos?)? Algumas destas atividades chegam a ocupar o “status” de pragas acadêmicas, devido à interferência que podem causar quando competem pela atenção do usuário (aluno ou pesquisador ou funcionário) com as “tradicionais” atividades de ensino e pesquisa, função primeira da academia. Sob a perspectiva do uso democrático e consciente dos recursos virtuais, limitar o acesso à Internet, instituindo regras de uso e censura de “sites” ou atividades específicas, parece violar o benefício maior da rede: a comunicação livre.
Mas, por mais que se queria preservar a liberdade do uso da internet (eu tenho defendido esta “causa” sempre que me confronto com situações de possível “mal-uso” do recurso), há de se reconhecer que abusos são REAIS, freqüentes, diversificados e podem sim comprometer o andamento de atividades acadêmicas. Não acredito que inovações da comunicação – mediadas pela internet - possam promover “desvios de comportamento” que transformem indivíduos satisfatoriamente integrados ao ambiente acadêmico em viciados integralmente absorvidos pela Internet (“chat maníacos”, “bloggeiros”, “orkuteiros” e outros “internáuticos” de plantão), apesar de reconhecer que existem “riscos” e até profissionais especializados em tratar de “viciados em Internet” (seja lá o que for isso...). A via do diálogo pode ser uma estratégia eficiente se houver disposição das partes envolvidas – o agente e o gerente.

Patologias à parte, é possível gerenciar o “bad” da Internet na academia, desde que respeitadas algumas regras básicas para uma convivência saudável, no laboratório de pesquisa ou na sala de aula. Assim como se desliga um celular numa sessão de cinema, o uso de recursos de Internet durante o “expediente” acadêmico deveria priorizar o aprendizado e a construção e divulgação de conhecimento científico-acadêmico. A escolha em utilizar o recurso de forma consciente pode ser estimulada, ao invés de “castigar” o mau-uso com restrições e censuras (há diversas instituições ou departamentos que bloqueiam eletronicamente o acesso a determinados “sites” como solução para minimizar abusos de uso da Internet, será que resolve?).

UGLY
Os vilões de praxe estão representados pelos inúmeros e constantes vírus de computador e variantes que contaminam a correspondência de e-mail e outros ambientes de Internet como spams, ad-wares e afins, incluindo mensagens na forma de corrente e propagandas comerciais, ideológicas e inutilidades de natureza variada.

As atividades comentados em “BAD” também podem ser promovidas à classificação “UGLY” quando ocorre o uso indiscriminado da infra-estrutura computacional (normalmente cara) mantida pela academia numa dimensão de larga-escala e com a explícita conivência institucional. Descrevo um episódio (sem dar nome aos santos...): ao participar de um concurso público para vaga de professor universitário na universidade XXX, procurei a biblioteca da instituição para fazer um levantamento bibliográfico e preparar a prova didática (uma aula sobre um tema sorteado com 24hs de antecedência) tive 2 surpresas: 1) havia na biblioteca uma grande quantidade de computadores com acesso IRRESTRITO à Internet disponível para a comunidade acadêmica, predominantemente alunos (horário: 9h30m) e 2) TODOS os computadores estavam ocupados e acessando páginas do Orkut (horário: 12h30m).

No primeiro momento achei que estava no primeiro mundo: computadores modernos para todos, promovendo a consulta ao acervo da biblioteca e a periódicos eletrônicos, porém sem restrição de acesso (o que diferia da estrutura disponível em algumas bibliotecas da Unicamp, onde apenas podia-se navegar pelo sistema de bibliotecas da instituição). Poder consultar emails, ler uma notícia de jornal, visitar algum “blog”, trocar algumas idéias via messenger naquele computador poderia transformar a própria biblioteca num ambiente ainda mais interativo, atraente à comunidade acadêmica por prover o acesso à www, propício para a troca de informações, enfim, ampliar o benefício da internet para atender tanto aos interesses acadêmicos – primordialmente - quanto à diversificada gama de interesses daquele integrante da academia, o que promove o bem-estar e a qualidade das relações entre instituição e membros.

No segundo momento constatei a triste (na minha opinião) realidade: não havia diversidade, o interesse em acessar a internet convergia integralmente, sem exceção, para as páginas do “site” de relacionamentos Orkut. A cena: todos os computadores ocupados, a funcionária da biblioteca me informa que se alguém (eu, no caso) precisar usar o computador para uma consulta aos acervos ela pede que o orkuteiro “libere espaço”. Um tanto constrangedor, não?!

Enfim, a internet na academia deve seguir um padrão liberal ou mais controlado? Será que estamos preparados para gerenciar nossa “liberdade” (ter liberdade para usar o recurso é diferente de fazer “mau-uso” do mesmo)? Será que estamos amadurecidos para fazer escolhas e ampliar os benefícios da relação academia-internet?
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